Série Mulheres da Amazônia
Setembro / Outubro, 2023 – Mulheres indígenas de comunidades do sul do Amazonas estão assumindo o protagonismo na implementação de ações sustentáveis com foco no combate às mudanças climáticas e vêm buscando soluções para problemas que envolvem a falta de valorização do papel delas na gestão de seus territórios e nas economias da floresta. Com participação ativa em pautas que afetam o bem-viver dos povos, um grupo esteve na Marcha das Mulheres Indígenas em Brasília, realizada entre os dias 11 e 13 de setembro.
Ao final do encontro, elas divulgaram uma carta distribuída a autoridades e órgãos públicos em que fazem um conjunto de demandas visando o fortalecimento de capacidades e competências de organizações locais. Solicitam, entre outros pontos, a formação continuada de mulheres em diversas áreas – agentes ambientais, comunicadoras, gestoras, lideranças – e o apoio a atividades produtivas, de segurança alimentar e de geração de renda.
Essa rede articulada é fruto do programa de formação Entre Parentas, realizado entre 2021 e 2022, pelo Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB) com o apoio da USAID/Brasil e de organizações indígenas locais. Envolveu 28 mulheres de regiões dos rios Purus e Madeira das etnias Apurinã, Tikuna, Mura, Jiahui, Parintintim, Paumari, Tenharim, Uru Eu Wau Wau e Juma. Algumas das atividades tiveram resultados positivos por meio de projetos criados pelas próprias mulheres para a produção de castanha, de óleo de babaçu e construção de sistemas agroflorestais (saiba mais aqui).
Agora, na carta divulgada após a Marcha, elas pedem o fortalecimento da rede, valorizando o conhecimento tradicional e o papel das mulheres indígenas na gestão territorial (leia a integra aqui).
“As mulheres que fizeram parte do Entre Parentas conseguiram unificar a articulação juntamente com as organizações indígenas locais e suas aldeias de origem. Trouxemos uma delegação grande e isso deu muita visibilidade dentro e fora do nosso território”, conta Daiane Tenharim, vice-coordenadora do Departamento das Mulheres Indígenas do Alto Madeira.
Daiane lembra que, desde a discussão inicial para a mobilização, em fevereiro, já vinha sendo discutida a divulgação de um documento final. “Mobilizamos as mulheres de todos os povos da região. Falamos da responsabilidade delas e colocamos a importância da participação no evento e na luta pelos direitos dos povos indígenas. Elas manifestaram interesse e pediram que a coordenação se empenhasse na busca de apoio. Foi o que fizemos.”
Segundo a coordenadora, o grupo também tem conseguido derrubar preconceitos e machismo. “As mulheres vieram para somar, não para disputar espaço com os homens. Nossa força é para empoderar o movimento indígena na defesa de nossos direitos. E temos visto que o esforço não é em vão. Muitos homens estiveram na marcha para contribuir com o suporte para que mulheres pudessem participar dos espaços de discussão. Eles fizeram a segurança, ajudaram na infraestrutura e outros serviços”, completa Daiane.
A região sul do Amazonas é alvo de desmatamentos e violência contra lideranças indígenas, além de pressões como incêndios criminosos, extração ilegal de madeira, narcotráfico, invasões e grilagem de terra, levando à perda da biodiversidade e ameaça aos povos tradicionais que ali vivem. Considerada uma das áreas mais críticas da Amazônia, vem registrando alterações das estações de chuva e impactos das mudanças climáticas, que afetam os roçados, a pesca e a qualidade da água.
“As mulheres que participaram do Entre Parentas aprenderam a monitorar os efeitos das mudanças climáticas a partir do olhar cotidiano e atuam como pesquisadoras em seus territórios. Elas têm conseguido valorizar as soluções tradicionais e criar espaços para novas perspectivas”, avalia Sara Gaia, da coordenação do programa Povos Indígenas do IEB. Para Sara, a articulação para a marcha mostrou o protagonismo que elas têm exercido.
Outras agendas - Além da marcha, o grupo aproveitou a viagem a Brasília para realizar uma série de reuniões com órgãos públicos, como o Ministério dos Povos Indígenas, onde as mulheres trataram da proteção territorial e denunciaram ameaças que lideranças têm enfrentado na Terra Indígena Tenharim Marmelos feitas por invasores.