Investindo na cultura quilombola em defesa do meio ambiente e do combate às mudanças climáticas
A cerca de 70 quilômetros de Macapá, capital do Estado do Amapá, a comunidade quilombola Carmo do Maruanum depende do rio Maruanum para se conectar com outros locais e até mesmo para que as crianças tenham acesso à escola. Em épocas de seca, o rio tem ficado com níveis cada vez mais baixos, o que dificulta a rotina dos moradores e a vida das crianças.
“Com a seca, as árvores estão morrendo mais e caindo no rio, dificultando a passagem de barcos. Esse impacto direto das mudanças climáticas trouxe uma situação muito diferente do que a gente tinha dez anos atrás. No inverno, quando o rio sobe, as coisas melhoram”, diz Lavousier Ferreira Vitor, morador da comunidade.
Vitor foi um dos jovens do local a participar do projeto-piloto desenvolvido em três comunidades quilombolas – duas no Amapá e uma em Goiás – para mapear indicadores de agricultura de baixa emissão de gases do efeito estufa e preservação de estoques de carbono visando dar destaque ao valor da contribuição destas comunidades para a mitigação e adaptação aos impactos das mudanças climáticas. O trabalho teve como base a metodologia desenvolvida durante os programas Novas Tecnologias e Compartilhando Mundos, desenvolvidos no âmbito da Parceria para a Conservação da Biodiversidade na Amazônia (PCAB).
Agora, dentro do projeto “Comunidades, Dados e Ação às Mudanças Climáticas - Reduzindo as barreiras ao acesso”, desenvolvido em parceria entre Google Earth Outreach e Equipe de Conservação da Amazônia (ECAM), com apoio da USAID, outras comunidades quilombolas vão participar do mapeamento socioambiental.
“A ideia é mostrar que o modo de vida quilombola, principalmente de produção de alimentos, contribui para a segurança alimentar ao mesmo tempo que preserva a floresta. Elas têm uma tradição de cultivar mandioca, hortaliças, frutas, que geram uma agricultura familiar de baixa emissão de carbono e cuja as técnicas não incluem a devastação dos ecossistemas”, conta Muryel Arantes, coordenadora de projetos da ECAM.
Normalmente, as roças nas comunidades são feitas dentro da floresta amazônica, em uma prática conhecida como agrofloresta, sendo uma importante fonte de alimentos orgânicos para os centros urbanos e protegendo as árvores em pé.
Os quilombolas são descendentes de africanos trazidos à força para o Brasil. Como fuga da escravização de seus povos, criaram espaços de resistência para preservar seu modo de vida, atualmente conhecidos como quilombos. Mas até hoje sofrem com falta de infraestrutura e de visibilidade. Para marcar e relembrar a contribuição política e cultural dos negros à sociedade, é comemorado em fevereiro, principalmente nos Estados Unidos e no Canadá, o Mês da História Negra (saiba mais aqui e aqui).
No Brasil, o Dia Nacional da Consciência Negra, em 20 de novembro, relembra a morte de Zumbi dos Palmares, último líder do quilombo dos Palmares, assassinado em 1695. Este mês é referência no país para atividades que inspiram a luta e a resistência do povo negro.
Participação comunitária - Durante o projeto-piloto, as duas comunidades quilombolas no Amapá usaram ferramentas de mapeamento Google para coleta e análise de dados para, por exemplo, identificar até mais de 80 mil toneladas de estoque de carbono sob sua proteção. Uma delas foi o aplicativo Ground, que também está sendo utilizado no TerraBio, ferramenta desenvolvida para avaliar o impacto de atividades do setor privado na biodiversidade. A ideia é trabalhar para simplificar os processos de coleta de dados e democratizar o acesso das comunidades para a ação contra as mudanças climáticas.
Agora, os aprendizados do piloto serão incorporados para ampliar o projeto às comunidades que participaram dos programas Novas Tecnologias e Compartilhando Mundos. Ambos somam quase 15 anos de trabalho, com mais de 200 comunidades tradicionais atendidas, entre quilombolas e indígenas, dos nove estados da Amazônia Legal. São fruto da parceria entre USAID/Brasil, Equipe de Conservação da Amazônia (Ecam), CONAQ, Google Earth Solidário, Imaflora e Natura.
As ações foram voltadas a auxiliar as comunidades nas análises dos dados e no uso estratégico das informações, para apoiar nas reivindicações das demandas identificadas pelas populações em várias áreas, entre elas saúde, infraestrutura, segurança alimentar e outras. Um dos objetivos dos programas também foi levar um formato adaptável às diferentes realidades das populações amazônicas. As pesquisas apoiaram as comunidades na busca pela autonomia e desenvolvimento sustentável.