Comunidades tradicionais começam a vencer barreiras para acesso a financiamentos públicos

“Por que organizações e empreendimentos comunitários não conseguem obter recursos de financiamentos públicos?” Essa foi uma das perguntas-chave que levaram o Observatório Castanha-da-Amazônia (OCA) a promover em agosto uma rodada de debates, dentro dos “Diálogos Pró-Castanha”, para tratar do financiamento para pequenos produtores de comunidades tradicionais na Amazônia.

“A dificuldade na cadeia da castanha e de outros produtos da sociobiodiversidade -- seja para custeio, capital de giro ou investimento -- reduz a chance de alcançar melhores preços e melhor remuneração, contribui para fragilizar boas práticas, reduzir a gestão da qualidade na cadeia, o controle, a rastreabilidade, além de prejudicar o desenvolvimento de capacidade técnica e de novas tecnologias”, avaliou André Machado, assessor técnico do OCA durante o evento, transmitido online. 

O OCA é uma rede de organizações que atua para desenvolver a cadeia da castanha, produzindo conhecimento e mobilizando os atores para consolidar um mercado justo visando a valorização das comunidades e povos envolvidos, além da conservação da floresta. 

Integram a parceria três parceiros implementadores da PCAB - o Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB), o IPÊ - Instituto de Pesquisas Ecológicas e o Serviço Florestal dos Estados Unidos (USFS). Fazem parte também Imaflora, Pacto das Águas, Operação Amazônia Nativa (OPAN), Cooperativa dos Agricultores do Vale do Amanhecer (Coopavam), Fundação Vitória Amazônica (FVA), WWF-Brasil, Conexsus, Instituto Socioambiental (ISA), Associação Floresta Protegida, Embrapa, Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS) e Memorial Chico Mendes. O projeto de estruturação do OCA vem sendo financiado pela USAID/Brasil e pela Aliança pelo Clima e Uso da Terra (CLUA, na sigla em inglês).

“Não há outro caminho se não o de trabalhar na busca da inclusão de extrativistas da cadeia da castanha e de outras atividades sociobiodiversas no Pronaf”, disse Carina Pimenta, diretora executiva do Instituto Conexsus, organização que trabalha para fortalecer a conservação dos ecossistemas naturais e é membro da Plataforma Parceiros pela Amazônia (PPA).

Neste ano, a Conexsus publicou um estudo mostrando oportunidades de financiamento para a cadeia da castanha-do-Brasil, que podem ser usadas em outros produtos da sociobiodiversidade, como o açaí. 

Além do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), o trabalho cita o consórcio Rede da Floresta, que comercializa produtos da sociobiodiversidade como estratégia alternativa de financiamento. A rede integra a organização Pacto das Águas e mais de 700 extrativistas de Rondônia, com apoio da USAID e assistência técnica do USFS.

Dificuldade para chegar na ponta - O Pronaf foi criado há mais de 25 anos pelo governo brasileiro para atender a agricultura familiar destinando recursos para custeio e investimento da produção. São oito subprogramas, entre os quais o chamado Pronaf B, que financia produtores rurais familiares. Entre as vantagens desse tipo de financiamento estão os juros muito baixos (0,5% ao ano), em relação aos juros de mercado, e um bônus para o produtor, que pode acabar pagando menos do que pegou emprestado, se pagar em dia.

Somente para a safra 2020-2021 foram colocados R$ 33 bilhões à disposição de pequenos produtores no país. O problema é que, desse total, 75% foram destinados às regiões Sul e Sudeste, enquanto o Norte, onde estão os extrativistas na Amazônia, ficou apenas com 7% (RS 2,3 bilhões) do valor. 

Para Luiz Lourenço, gerente executivo de Pessoa Física do Banco da Amazônia (Basa), que também participou da discussão, não serão alcançados resultados caso seja apenas concedido crédito aos extrativistas. “É muito importante oferecer assistência técnica, ter a participação de alguém da comunidade que seja preparado para entender de educação financeira, formas de gestão e importância do custeio. Tudo deve vir acompanhado da celeridade na concessão do recurso”.

Outro exemplo - Entre 2019 e 2020, por meio do Pronaf concedido pelo Basa, a Cooperativa Mista Agroextrativista Nossa Senhora do Perpétuo Socorro do Rio Arimum (Coomnspra) conseguiu, pela primeira vez, captar recursos em banco para financiar a exploração sustentável de madeira na Reserva Extrativista Verde para Sempre, localizada no Estado do Pará.

Com a iniciativa, evitaram a dependência de intermediários, garantindo maior autonomia na gestão do plano de manejo sustentável da floresta no município de Porto de Moz. O projeto  teve sucesso e, no ano passado, os manejadores conseguiram, de forma inovadora, quitar antecipadamente o valor (leia em https://pcabhub.org/pt-br/noticias/noticias-destaques-pcab/cooperativa-de-manejo-florestal-comunitaria-na-amazonia-paga-credito-bancario-antes-do-prazo


Assista aos “Diálogos Pró-Castanha” em https://www.youtube.com/watch?v=mq4qqjuT2yMhttps://www.youtube.com/watch?v=H-bBiHdK_0U (em Português)