Indígenas fortalecem estratégias de proteção territorial no Mosaico Gurupi
Dezembro, 2024 (*) – A última grande mobilização em defesa das florestas da Amazônia Oriental ocorreu em 2014, quando uma aliança histórica entre os povos indígenas do norte do Maranhão foi consolidada na Serra do Bicho, território sagrado do povo Tenetehara, localizado na Terra Indígena Caru (MA). Naquele encontro emblemático, uma das decisões mais marcantes foi a integração dos territórios indígenas ao Mosaico Gurupi. Nove anos depois, esses territórios voltaram a se reunir para reafirmar o compromisso como guardiões da vida e da biodiversidade nesta região essencial da Amazônia.
“Este encontro também entra para a história”, declarou Rosilene Guajajara, ao falar sobre o evento Trilhando Ações Estratégicas de Proteção e Gestão Territorial do Mosaico Gurupi, realizado de 19 a 21 de novembro, na Aldeia Maçaranduba, na Terra Indígena Caru. “Estamos celebrando a nossa força na proteção da vida em nossos territórios”, enfatizou Rosilene, que atua como secretária adjunta dos Direitos dos Povos Indígenas do Maranhão.
O evento reuniu cerca de 250 participantes, entre representantes de nove povos indígenas – Guajajara, Awá Guajá, Ka’apor, Tembé, Krahô, Krikati, Kanela, Apinajé e Akroá Gamela –, de instituições governamentais e de ensino, além de organizações da sociedade civil.
O objetivo central foi promover o compartilhamento de experiências e discutir estratégias para enfrentar desafios relacionados à proteção territorial, como o controle de invasões, o desmatamento e a prevenção e combate a incêndios florestais. Também buscou fortalecer uma rede de colaboração entre os povos indígenas, incentivando ações conjuntas para manter a floresta em pé e garantir um futuro sustentável para as próximas gerações.
O encontro foi promovido pelo Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), Associação Wirazu e pela Coordenação das Organizações e Articulações dos Povos Indígenas do Maranhão (Coapima), no âmbito do projeto Aliança dos Povos Indígenas pelas Florestas da Amazônia Oriental, apoiado pela USAID.
A iniciativa é conduzida em parceria com o Centro de Trabalho Indigenista (CTI), o ISPN, a Coapima, a Articulação das Mulheres Indígenas do Maranhão (Amima) e a Associação Wyty Catë das Comunidades Timbira do Maranhão e Norte do Tocantins. O evento contou ainda com o apoio da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), do Programa Copaíbas/Fundo Nacional para a Biodiversidade (Funbio), do Floresta+/PNUD, da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) e do Projeto Paisagens Indígenas, apoiado pela Iniciativa Internacional da Noruega para o Clima e Florestas.
A urgência do reconhecimento – Localizado entre o Maranhão e o leste do Pará, o Mosaico Gurupi é uma das áreas mais importantes para a conservação da Amazônia Oriental. Abrange cerca de 46 mil km² e é composto pelas Terras Indígenas Araribóia, Caru, Rio Pindaré, Awá, Alto Turiaçu, Alto Rio Guamá e pela Reserva Biológica do Gurupi. É considerado um patrimônio socioambiental com rica biodiversidade, incluindo espécies endêmicas de fauna e flora.
Apesar de sua importância, o Mosaico Gurupi enfrenta ameaças constantes. A extração ilegal de madeira, a caça e pesca predatórias e o desmatamento para pecuária extensiva comprometem a integridade do território. Esses desafios são agravados por incêndios florestais, intensificados pelas mudanças climáticas e períodos de seca prolongada, que ameaçam tanto o ecossistema quanto a sobrevivência das comunidades indígenas.
“Protegemos esses territórios porque aqui é a nossa casa. Observamos os impactos das mudanças climáticas: seca, fogo e, como povos indígenas, defendemos as últimas florestas do nosso Estado”, destaca o cacique Antônio Wilson, da aldeia Maçaranduba, que também ocupa o cargo de secretário executivo do Conselho Gestor do Mosaico Gurupi.
Para João Guilherme Nunes Cruz, coordenador do Programa Povos Indígenas do ISPN, o reconhecimento da formação do Mosaico Gurupi é essencial para fortalecer as estratégias de proteção territorial. “Garantirá mais apoio institucional às ações articuladas de gestão ambiental e fortalecerá a interface entre as Terras Indígenas e a Reserva Biológica do Gurupi, as únicas áreas protegidas dessa parte da Amazônia”, explica.
O encontro foi uma oportunidade para reforçar a demanda pela formalização do Mosaico Gurupi, com a construção de um plano de proteção territorial. Foi elaborado um documento que reivindica esse reconhecimento oficial pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e pelo Ministério dos Povos Indígenas (MPI).
Ao fazer um compartilhamento de estratégias locais de defesa territorial, o povo Ka’apor contou da experiência ao implementar a ocupação dos limites de seu território e a fundação de novas aldeias como forma de conter invasões. “Observamos uma redução drástica nas invasões, apesar de estarmos cercados por povoados não indígenas”, relatou Akadjurichan Ka’apor, líder dos Guardiões.
As mulheres tiveram destaque nas ações de proteção. As Guerreiras da Floresta, da Terra Indígena Caru, falaram da promoção de campanhas de conscientização junto às comunidades vizinhas, enquanto na Terra Indígena Rio Pindaré atuam na recuperação de nascentes, em parceria com brigadas voluntárias indígenas. Ao tratar da juventude, houve destaque para a importância de eles assumirem um papel ativo tanto no monitoramento dos territórios quanto na articulação política.
Troca de experiência – Os povos Timbira do Cerrado maranhense e do norte do Tocantins participaram do evento para conhecer a estratégia de gestão baseada na formação de mosaicos, destacando a importância como modelo de conservação e gestão compartilhada.
(*) Material informativo (texto e vídeo) foi produzido por Andreza Baré (ISPN) e Fernando Ralfer (CTI)