Tecnologia: jovens aprendem a usar a comunicação na luta por direitos
Agosto/Setembro, 2024 (*) – Wirapitang Ka’apor viajou cerca de 24 horas, percorrendo quase 800 km, até chegar ao Centro Timbira de Ensino e Pesquisa Pënxwyj Hëmpejxà, em Carolina, no estado do Maranhão. Ele saiu da aldeia Xiepihürenda, na Terra Indígena Alto Turiaçu, localizada no norte do Maranhão, na divisa com o Pará. Em outro extremo, no Norte do Tocantins, Phakim Krahô iniciou seu deslocamento da aldeia Recantos dos Irmãos, na Terra Indígena Kraolândia.
Phakim, Wirapitang e mais 39 jovens indígenas dos territórios Apinajé, Araribóia, Bacurizinho, Cana Brava, Carú, Escalvado, Governador, Krikati, Porquinhos, Rio Pindaré e Taquaritiua viajaram para participar da etapa presencial (entre 29 de julho e 1º de agosto) do segundo ciclo de “Formação de Comunicadores Indígenas do Maranhão e Norte do Tocantins”. A formação seguirá até dezembro com encontros semanais online, “no quadradinho” – como os comunicadores costumam se referir ao layout das plataformas de reuniões virtuais.
A formação busca fortalecer as capacidades de comunicação dos povos indígenas, permitindo que eles sejam protagonistas na narração de suas histórias e na divulgação de suas lutas e conquistas. Com o apoio da USAID, é uma iniciativa do Centro de Trabalho Indigenista (CTI) e do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), em parceria com as organizações indígenas no âmbito do projeto “Aliança dos Povos Indígenas pelas Florestas da Amazônia Oriental: Conservar, Proteger e Restaurar”. Contempla jovens dos povos Apinajé, Kanela Memõrtumré, Kanela Apanyekrá, Gamella, Gavião, Guajajara, Ka’apor, Krikati, Krahô e Tembé, que fazem parte dos grupos Tupi e Timbira.
Ferramenta de resistência e luta – Nos últimos anos, a comunicação tem sido uma ferramenta de luta e promoção dos direitos indígenas, contribuindo para a preservação das culturas tradicionais, para a mobilização social e fortalecimento do movimento indígena.
O presidente da Associação Wyty-Catë (uma das organizações indígenas parceiras do projeto), Oscar Apinajé, destaca que o espaço de capacitação dos comunicadores é uma preparação de jovens lideranças, com formação política. “Vocês vão construir nosso projeto de futuro para as próximas gerações. Não adianta adquirir o conhecimento e não praticar. Vocês terão um papel importante dentro das suas comunidades, na defesa dos nossos direitos.”
Para Phakim Krahô, a comunicação é uma ferramenta de defesa dos territórios. “Essa formação é uma coisa nova para nós Krahô. Ela vem para que tenhamos um conhecimento melhor, para aprender a comunicar de forma que pessoas não-indígenas entendam nossa mensagem. Uma boa comunicação é uma defesa, uma proteção para nosso território”.
Segundo o indígena Marciel Krikati, a comunicação e as ferramentas tecnológicas representam a voz da juventude. “Antigamente, os mais velhos faziam a resistência por meio da linguagem, da cantoria. Hoje, nós, jovens, temos nossa voz através das câmeras, da tecnologia. Hoje temos essa ferramenta de luta, que é a comunicação.”
O coordenador executivo do CTI, Jaime Siqueira, disse que a expectativa é que, ao final do curso, os comunicadores indígenas estejam preparados para atuar como vozes representativas e influentes de suas comunidades. “Vocês vão ter um papel político importante dentro das suas comunidades e das organizações. Isso é central dentro deste curso. Temos um enfoque na comunicação e na formação de novos quadros de lideranças. A comunicação não faz sentido sozinha, isolada. O que estamos fazendo aqui é fortalecer a luta de todos os dias.”
Aprendizados – Durante a formação os jovens aprendem introdução à fotografia, produção audiovisual, design gráfico e protagonismo indígena. Há oficinas com técnicas de redação e criação de storytelling, gestão de redes sociais e capacitação para que os comunicadores possam desenvolver e gerenciar seus próprios projetos de comunicação.
Os participantes recebem smartphone, estabilizador para celular e computador, equipamentos necessários para a realização de atividades online e produção de conteúdos multimídia.
“A gente sofre tanta violência dentro do nosso território. E as narrativas são sempre como se fôssemos nós, os indígenas, os causadores dessas violências. Isso me deixa muito triste. Então resolvemos começar a reescrever essa narrativa, de nós para nós, e para outras pessoas que não conhecem nossa realidade, nossas histórias”, afirma Cruupyhre Akroá, do Povo Gamela.
(*) Texto escrito por Fernando Ralfer, do CTI, editado por USAID Brasil