Indígenas Paiter Suruí de Rondônia participam pela primeira vez de programa de formação totalmente online

Indígenas Paiter Suruí que vivem no território Sete de Setembro, em Cacoal (RO), participaram pela primeira vez de um módulo totalmente online do Programa de Formação em Governança Econômica Territorial Indígena (PFGETI).

O programa é promovido pela Forest Trends, com apoio da Parceria para a Conservação da Biodiversidade na Amazônia (PCAB), USAID/Brasil e CIAT/Aliança Biodiversidade Internacional, e desenvolvido em parceria com a Universidade Federal de Rondônia (UNIR), ECOPORÉ e Centro Cultural Wagôh Pakób.

Em decorrência da pandemia da COVID-19, o quarto momento do PFGETI (com módulos temáticos sobre economia e mercados e gênero e geração) foi realizado a distância durante duas semanas, graças ao acesso à internet nas aldeias. Este momento de formação servirá de piloto para a próxima edição, que vai envolver sete Terras Indígenas (TIs) do Mosaico Tupi, com 20 povos, em um só programa.

"A pandemia nos levou a pensar em outras formas de seguir com a proposta de formação. Estamos produzindo um relatório com avaliação consistente da experiência obtida com os Paiter Suruí, que servirá de referência para a adaptação da estratégia do modelo virtual", afirma Márcio Halla, coordenador de projetos de governança econômica indígena no Forest Trends.

Segundo Halla, para garantir o acesso dos indígenas à internet, serão instalados 11 pontos em aldeias que ainda não têm conexão online, beneficiando cerca de 20 povos indígenas das sete TIs.

O programa vem sendo desenvolvido no Peru, Colômbia, Equador e Brasil, com apoio da Agência Norueguesa de Cooperação para o Desenvolvimento (NORAD), e seu objetivo é  fortalecer os processos de governança territorial. No caso do programa com abordagem econômica, também visa a aprimorar as capacidades dos indígenas para que mantenham sua economia tradicional e desenvolvam suas iniciativas econômicas. Com isso, garantem condições de geração de renda, com a conservação da floresta em pé e da biodiversidade da Amazônia.

Na TI Sete de Setembro, como nas várias edições do programa, o curso é composto por seis módulos de formação, cada um com dois temáticos. Entre dezembro e março, haviam sido aplicados três deles presencialmente. Entre os aprendizados já obtidos estão, por exemplo, o aumento da participação das mulheres, a valorização da importância da troca do conhecimento entre gerações e uso desse aprendizado na construção de soluções de problemas das comunidades.

“Estamos vendo um número grande de mulheres participando das aulas. Geralmente elas são muito tímidas, quase não falam em reuniões com homens. Além disso, os indígenas também têm adquirido mais desenvoltura e conhecimento das questões econômicas. Esse resultado é possível perceber por meio das palavras, do interesse e da participação”, avalia Maria do Carmo Barcellos, líder de mediadores culturais e gênero da Forest Trends.

Essa desenvoltura de que fala Maria do Carmo pode ser notada nas palavras da indígena Lucimeire Sodan Surui ao fazer uma intervenção na aula que tratou de gênero e geração. “Ser mulher indígena, posso definir, como ser uma guerreira lutando contra a violência e reivindicando nossos direitos. Estamos defendendo o futuro. Não estamos ultrapassando os homens indígenas, mas sendo companheiras e ajudando nessa luta”, resumiu Lucimeire quando pediu a palavra.  

No total, o PFGETI tratará de 12 temas, a maior parte deles com foco em questões econômicas. Entre eles estão desenvolvimento e bem-viver; território, globalização e direitos indígenas; planos de vida, gestão e outros instrumentos de governança; economia indígena, gênero e geração. 

Em 2018, o programa já foi realizado na TI Rio Branco, também no Estado de Rondônia. Na avaliação dos resultados, já havia sido detectado que entre as contribuições para os participantes estavam os conhecimentos adquiridos e aprimorados e a compreensão da necessidade de valorizar suas culturas para hoje e para o futuro. Outro aprendizado comentado pelos participantes foi a possibilidade de desenvolver a habilidade de falar em público e trabalhar coletivamente.

Etapas - Na TI Sete de Setembro, além dos módulos, o programa conta com o desenvolvimento de práticas formativas, que são projetos desenvolvidos pelos indígenas para aplicar o que foi aprendido no curso. Os grupos são constituídos, geralmente, por mulheres, anciãos, lideranças e jovens, permitindo assim uma troca de conhecimento intergeracional.

Nas práticas formativas os indígenas definem o projeto, levam para a comunidade, discutem e, às vezes, até mudam o objetivo, para depois desenvolver o tema. Um dos exemplos é a montagem de um arranjo produtivo da cadeia do cacau. “Alguns indígenas nunca fizeram um estudo de cadeia produtiva. Então o professor orienta e a proposta é construída”, completa Maria do Carmo.

Para o futuro, há a estratégia de transformar o programa de formação em um curso contínuo, uma oferta acadêmica constante, que possa atender todos os indígenas interessados pelo tema da governança territorial indígena. De acordo com Halla, uma parceria com a Universidade Federal de Rondônia está abrindo esta possibilidade.