Expedições pela floresta fortalecem o monitoramento de territórios e a preservação da tradição indígena
Localizar áreas dentro da floresta que concentram espécies da flora e da fauna, algumas usadas na medicina tradicional e na produção de artesanato, registrar regiões ricas em árvores frutíferas e detectar pontos estratégicos de Terras Indígenas (TIs) ameaçados por invasores. Esses foram alguns dos resultados obtidos nas expedições de agentes ambientais indígenas, retomadas no fim do ano passado nas TIs Kanela e Porquinhos, localizadas no Estado do Maranhão, na Amazônia Legal.
Depois de quase dois anos sem esse tipo de atividade, suspensa pela pandemia de COVID, as expedições ocorreram dentro do projeto Gestão Ambiental e Territorial Integrada de TIs na Amazônia Oriental. Para realizá-las, foram adotadas todas as medidas de segurança sanitárias necessárias, principalmente contar com a vacinação nas comunidades.
O projeto, apoiado pela Parceria para a Conservação da Biodiversidade na Amazônia (PCAB), foi criado por meio de um acordo de cooperação entre a USAID/Brasil e o Centro de Trabalho Indigenista (CTI). Tem também a participação do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), da organização Wyty-Catë das Comunidades Timbira do Maranhão e Tocantins, da Coordenação das Organizações e Articulações dos Povos Indígenas do Maranhão (COAPIMA) e da Articulação das Mulheres Indígenas do Maranhão (AMIMA).
"As expedições são uma forma de troca de experiências, além de fazer o monitoramento territorial. A participação das mulheres enriqueceu muito o trabalho, com destaque no reconhecimento de plantas de uso relevante no cotidiano e em rituais, como a fabricação de artesanatos, artefatos e adornos, além da localização de plantas medicinais do Cerrado, tradicionalmente usadas pelos povos Timbira", explica Pollyana Mendonça, do CTI.
As duas TIs, que reúnem cerca de 2.700 indígenas, ficam em uma região de transição entre os biomas Amazônia e Cerrado, tipo de vegetação mais encontrada em estados do centro-oeste brasileiro.
Para realizar essas atividades de campo, os indígenas passam dias caminhando pela floresta com o objetivo de montar um mapeamento participativo do monitoramento e controle territorial, reunindo dados geográficos e culturais.
Em cada TI, as próprias comunidades escolhem os participantes, contemplando a diversificação de gênero e de geração. São acompanhados pelos agentes ambientais Mentuwajê (que significa jovens defensores do meio ambiente) e definem, em conjunto, os locais focos do monitoramento.
Essas expedições são atividades intermódulos, que fazem parte do ciclo de formação de agentes ambientais indígenas. Nesta etapa o objetivo é promover uma formação inicial em mapeamento participativo utilizando instrumentos de registro escrito, audiovisual e geoespacial. A intenção é levantar informações ambientais para qualificar os mapas das TIs e criar estratégias junto às comunidades de monitoramento e controle territorial.
As expedições percorreram 900 km (um pouco mais do que a distância entre Manaus e Porto Velho) na TI Kanela e 700 km em Porquinhos. Ao todo participaram 20 agentes ambientais indígenas, entre eles sete mulheres.
Antes do trabalho de campo, há uma fase de preparação dos materiais e insumos necessários para a atividade, como alimentação e equipamentos de segurança. Ao final, foram feitas reuniões de devolutiva com as lideranças e comunitários, no pátio das aldeias, apresentando um resumo dos percursos e das experiências nas expedições. As primeiras atividades deste tipo haviam sido promovidas em novembro de 2019.
Conhecendo o território - As mulheres indígenas contribuíram, por exemplo, na localização de capim tiririca – planta de até 60 cm de altura com folhas finas e usada na produção de colares e outros adornos – e de árvores conhecidas como pau de leite, utilizadas em pinturas corporais.
Ao percorrerem os limites de ambas as TIs, os grupos monitoraram diferentes paisagens, incluindo serras, matas fechadas, margens de rios e afluentes, nascentes, capoeiras, setores de roça, aldeias antigas, entre outros.
Durante o percurso foram encontradas passagens recentes de invasores, além de marcos de delimitação das TIS retirados e até caçadores armados dentro do território. Houve ainda a localização de nascentes assoreadas e lagoas secas devido à retirada ilegal da mata ciliar por madeireiros e incêndios florestais.
Cada Mentuwajê contou suas próprias impressões do trabalho em sua língua materna. Para este ano, as duas turmas de agentes ambientais indígenas continuam mobilizadas, dando sequência ao trabalho.