8 de março: comemoração dupla para Carina, indígena que vive na Amazônia

Em 8 de março, Dia Internacional da Mulher, nascia há 31 anos na Reserva Roosevelt, no coração da Amazônia, a indígena Carina Cinta Larga, cujo povo tinha a caça como atividade central de subsistência, com pouca agricultura. Neste ano, a data que marca no mundo todo a luta pelo empoderamento e igualdade de direitos das mulheres será comemorada duplamente por Carina.

Além de seu aniversário, a indígena celebrará com outras mulheres de sua aldeia a conquista que elas tiveram ao implementar durante a pandemia de COVID-19 um projeto de retomada do plantio de produtos agrícolas para alimentação. “Nós somos mães, sabemos que não pode faltar comida para nossos filhos, nos preocupamos com o futuro. Quando o isolamento começou, tudo ficou mais difícil. Aí resolvemos nos unir e ir para a roça plantar”, conta Carina.

Porém, para o projeto decolar, as mulheres enfrentaram dificuldades e, principalmente, resistência. “Por sermos mulher, eles (homens da aldeia) não davam atenção, diziam que não daria certo, que não conseguiríamos. Fomos nos ajudando umas às outras e o resultado foi impressionante. O projeto mudou nossa forma de pensar”, comemora a indígena.

Como tudo começou - Em outubro de 2020, quando o isolamento por causa da pandemia ainda afetava vários Estados da região amazônica, as mulheres da Terra Indígena (TI) Roosevelt, em Rondônia, que já tinham formado um grupo há cerca de um ano, decidiram buscar formas de obter recursos. Resolveram, então, retomar o plantio de culturas como milho, cará, inhame e mandioca, produtos que tradicionalmente fazem parte da culinária do povo Cinta Larga.

Para ajudá-las, a Iniciativa Comunidades e Governança Territorial da Forest Trends (ICGT-FT), um dos implementadores da Parceria para a Conservação da Biodiversidade na Amazônia (PCAB), que atua na TI por meio do projeto Nossa Floresta Nossa Casa, fez uma articulação com o Fundo Casa Socioambiental. 

Com o apoio da consultora da Forest Trends Tatiana Tintino, o grupo de mulheres conseguiu aprovar um projeto com o Fundo para a compra de materiais (ferramentas para os roçados), sementes e mudas, e um apoio emergencial relacionado com a pandemia de COVID-19, com cestas básicas e materiais de higiene.

“O dinheiro para compra de todo o material veio por meio do Fundo Casa. Conseguimos uma parceria com a AGIR (Associação das Guerreiras Indígenas de Rondônia) para intermediar o recurso, além do apoio da Funai para a entrega dentro da TI”, afirma Tatiana. 

O objetivo do programa Nossa Floresta Nossa Casa, que tem o apoio da PCAB, é desenvolver cadeias de sociobiodiversidade indígena na Amazônia, estimulando oportunidades para geração de renda, conservação e uso sustentável dos territórios, em uma área total de cerca de 1,5 milhão de hectares.

Além das culturas tradicionais, as mulheres também decidiram plantar arroz. “Para estimular as produções locais e incentivar a articulação, compramos as sementes de arroz produzidas pela etnia indígena Arara visando o fortalecimento também dessa comunidade”, completa Tatiana.

No início, os trabalhos começaram com 39 mulheres. Atualmente, já envolvem mais de 70. Passados pouco mais de quatro meses, algumas delas começaram a colher os primeiros resultados do plantio.

Segundo Carina, algumas indígenas conseguiram vender uma pequena parte da colheita. “A roça tradicional estava acabando entre o nosso povo. Conseguimos trazê-la de volta e agora podemos passar para nossos filhos”, afirma Carina, mãe de três crianças.

A indígena diz que o grupo de mulheres pensa em retomar uma outra tradição que está esquecida na aldeia: a festa da colheita, evento em que toda a comunidade se reunia para comemorar os resultados obtidos com danças e tradições.

“O preconceito sempre vai existir, seja porque somos mulheres ou indígenas. Mas precisamos ter muita força, passar por cima disso e não desanimar dos nossos sonhos”, ensina Carina.