Série: PCAB Transformando Vidas

Impacto da PCAB no cotidiano de jovens de comunidades tradicionais da Amazônia

Capacitar jovens para impedir o êxodo para as cidades em busca de emprego e facilitar a formação de novas lideranças entre eles é um aspecto importante da Parceria para a Conservação da Biodiversidade na Amazônia (PCAB). Também se torna fundamental no fortalecimento da gestão e do modo de viver das comunidades tradicionais, sejam elas indígenas, ribeirinhas e quilombolas.

Projetos apoiados pela PCAB e USAID/Brasil em 2020 levaram capacitação a cerca de 503 grupos, associações e organizações na Amazônia, sendo que 84.246 membros de comunidades receberam benefícios socioeconômicos. Nos projetos ligados ao engajamento do setor privado, 75,38% dos que foram treinados e receberam benefícios eram jovens entre 15 e 29 anos.

Nesta edição, levamos você ao Pará, a Roraima e ao Amazonas para conhecer Maria HelenaAlcebiasCésar Henrique e João Paulo, que contam o que o envolvimento nos projetos apoiados pela USAID/Brasil mudou em suas vidas.

1 - Independência às comunidades

"É muito gratificante quando uma comunidade nos diz que, com o mapa e o trabalho desenvolvido pela equipe Guajarina, ela conseguiu dar andamento no processo de titulação de terra ou foi possível exigir políticas públicas para melhorar a estrutura." É assim que Maria Helena Cunha dos Santos diz se sentir quando fala de sua atuação em comunidades quilombolas do Estado do Pará. 

Ela é uma das integrantes da equipe de jovens chamada Guajarina, criada em 2018 como resultado do Compartilhando Mundos, uma parceria da Ecam, USAID/Brasil, Google Earth Outreach e associações locais, como a CONAQ (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas).

O programa, uma continuação do projeto Novas Tecnologias e Povos Tradicionais, capacitou representantes das próprias comunidades, principalmente jovens, e disponibilizou ferramentas para que eles desenvolvessem um levantamento de dados socioeconômicos dentro dos territórios. Também fizeram mapas que mostram a localização e limites das áreas quilombolas na Amazônia. 

Atualmente, a equipe Guajarina atua em 57 comunidades quilombolas do Pará assessorando no georreferenciamento dos territórios e capacitando jovens para buscar melhorias da estrutura desses locais, como escolas, água tratada, saneamento, entre outros. 

Maria Helena, de 27 anos, é moradora da comunidade Ramal do Piratuba, no município de Abaetetuba, a 123 km da capital, Belém, uma das que já conseguiram titulação no Estado. Ela lembra, porém, que várias outras ainda lutam por esse reconhecimento. "A titulação é um importante instrumento de preservação do território, principalmente diante das constantes ameaças de grileiros de terra e de desmatadores", afirma.

Formada em Agronomia pela Universidade Federal do Pará, agora está cursando mestrado pela Universidade Federal Rural da Amazônia e diz que o estudo abriu horizontes, permitindo uma visão mais ampla da sociedade.  "Antes os jovens quase não participavam. Hoje eles buscam estudo e querem voltar às comunidades para contribuir com o local onde nasceram. Nossa ligação com a terra é muito grande, faz parte da gente", completa.

Segundo ela, os jovens quilombolas também têm buscado aliar conhecimentos técnicos ao tradicional, preservando a cultura e os costumes dos quilombolas. "Os mais velhos são os guardiões do conhecimento do nosso povo. Temos o dever de ouvi-los."  

Ao ser questionada sobre o que tem representado participar desse processo, Maria Helena conclui: "Tudo isso trouxe muito conhecimento e vontade de querer ajudar as comunidades a melhorarem a qualidade de vida, além de buscar alcançar a tão sonhada titulação".

2 - Fortalecendo territórios

A luta constante pela defesa dos territórios para evitar que o desmatamento ilegal e o garimpo avancem em Terras Indígenas (TIs) na Amazônia é um dos desafios enfrentados pelos povos que vivem na Raposa Serra do Sol, no Estado de Roraima. Nesse cenário, a formação de jovens lideranças tem contribuído para que eles assumam um papel cada vez mais importante na defesa da autodeterminação e contra invasões.

"A proteção do território vem em primeiro lugar porque sem ele não há acesso à educação, à melhor qualidade de vida, à comunicação... Os territórios foram conquistados por nossos anciãos com base em muita luta e até hoje continuam sob ameaças constantes", resume o indígena Alcebias Mota Constantino, do povo Sapará. 

Coordenador estadual da Juventude do Conselho Indígena de Roraima (CIR), Constantino destaca que um dos caminhos para fortalecer os jovens diante dos desafios é capacitá-los. "Nosso papel é incorporar as novas ferramentas. Antigamente atacavam nosso povo com armas. Hoje é com papel e caneta. Então estamos aprendendo a usar papel e caneta também. Temos jovens estudando para serem advogados, médicos, agrônomos, e, com isso, se adaptando aos novos tempos", diz o coordenador.

Atualmente com 25 anos, Constantino lembra que participa de movimentos de juventude indígena há mais de uma década. "Por meio de projetos apoiados pela PCAB, a gente vem fazendo intercâmbio de conhecimento e tratando de temas que vão de sustentabilidade até formação política." 

Um desses projetos é o Bem-Viver dos Povos Indígenas de Roraima, apoiado pela PCAB e implementado pelo CIR, Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB) e a ONG Nature and Culture International (NCI). Ele visa a melhorar a governança territorial e gestão ambiental das TIs do Estado e promover geração de renda por meio do desenvolvimento sustentável de cadeias produtivas. 

Em Roraima, são 32 TIs, com 246 comunidades, abrangendo uma população de cerca de 50 mil indígenas. Constantino diz que uma das dificuldades atualmente é a locomoção entre esses territórios. “Os jovens hoje querem ter acesso a informação, ao conhecimento, a troca de dados sobre identidades. Cada um com seu modo de se organizar e viver diferente”, completa. Segundo ele, um dos próximos passos é montar um banco de dados para ter mais informações sobre os jovens que participam do grupo.

Ao falar sobre o futuro, Constantino diz esperar que os jovens assumam cada vez mais protagonismo em suas comunidades, defendendo os territórios e preservando a cultura de cada povo. "Minha participação na liderança de projetos faz com que fique tempo longe da aldeia. Mas uma vez, quando voltei, uma de minhas filhas me abraçou e falou: 'No dia em que sua luta terminar, a minha começa'. Fiquei emocionado porque isso mostra que já deixei uma semente plantada, uma mensagem de união e força."

3 - Novas lideranças

Mostrar como as populações ribeirinhas da Amazônia podem atuar para fortalecer cadeias de valor sustentáveis preservando, por exemplo, o pirarucu selvagem. Trocar experiências sobre formas para minimizar os impactos das mudanças climáticas na agricultura tradicional. Apresentar formas de melhorar a infraestrutura das comunidades para contribuir na qualidade de vida dos moradores. Tudo isso com a participação de jovens.

Esses trabalhos fazem parte da rotina dos agentes ambientais voluntários, como César Henrique Cunha e João Paulo Menezes. Jovens lideranças, os três atuam na comunidade São Raimundo, no município de Carauari, no Médio Juruá.

“Nosso foco é manter os jovens nas comunidades, com consciência do seu papel para melhorar a vida local. Mostramos a eles que temos uma história a construir aqui dentro da Amazônia que só depende de nós”, diz Henrique.

Os dois participam das frentes de educação do programa Território Médio Juruá, gerido pela SITAWI, com apoio da USAID/Brasil em parceria com Natura e Coca-Cola Brasil Também tem o envolvimento de associações e entidades locais.

Cerca de 130 jovens já passaram por programas de capacitação ambiental nas comunidades do Médio Juruá antes da pandemia da Covid-19. Com o isolamento social imposto pela pandemia, as oficinas foram substituídas pelos trabalhos em cada uma das comunidades. 

“Hoje vemos que os jovens buscam participar de suas comunidades, ir às reuniões como representantes. Estamos percebendo aos poucos um pensamento novo”, afirma João Paulo.

Ambos vêem na capacitação e formação das lideranças uma forma de preservar a floresta em pé e sua biodiversidade. “Chamamos a atenção para as questões da Amazônia. A mensagem aos jovens é não desistam dos sonhos e da caminhada para fazer o futuro da floresta e do Brasil”, conclui Henrique.