Planos de gestão: projetos incluem desde roças até trabalho com couro

PGTAs visam incentivar bem viver e ações sustentáveis em comunidades indígenas

Fevereiro, 2023 - O respeito à ancestralidade e à conservação de ritos tradicionais. A transmissão do conhecimento para as novas gerações e a sustentabilidade de programas de geração de renda que mantém a floresta em pé. Esses são alguns dos ingredientes que foram considerados na implementação de oito Planos de Gestão Territorial e Ambiental (PGTAs) dentro do Projeto “Promovendo o Bem Viver dos Povos Indígenas em Roraima”

Outros três planos estão sendo criados para atender comunidades da Terra Indígena (TI) Raposa Serra do Sol, onde moram povos Macuxi, Wapichana, Taurepang, Ingarikó e Patamona

O projeto Bem Viver é desenvolvido pelo Conselho Indígena de Roraima (CIR) juntamente com o Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB) e a organização Natureza e Cultura Internacional (NCI), com o apoio da USAID/Brasil. Tem o objetivo de apoiar a implementação de ações previstas na Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PNGATI).

“No plano de gestão você vai falar sobre saúde, educação, conhecimento tradicional e de como as comunidades estão se organizando. Os próprios indígenas apontam os lugares sagrados, o centro da comunidade, o que querem plantar e como podem gerar renda”, explica a gestora ambiental Sinéia do Vale Wapichana, coordenadora do Departamento de Gestão Territorial e Ambiental do CIR. 

Nascida na região da Serra da Lua, Sinéia é autoridade do clima da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab). É uma das lideranças que vêm lutando para que as comunidades indígenas de Roraima sejam ouvidas por suas próprias vozes, definindo suas prioridades na gestão dos territórios.

Segundo Sinéia, com o projeto Bem Viver foi possível dar resposta a demandas dos indígenas. “Para nós, foi muito gratificante poder implementar esses planos, que trouxeram o que as comunidades queriam para a melhoria da qualidade de vida.”

Entre as atividades implantadas estão o apoio à produção de farinha, a montagem de roças comunitárias, a criação de peixes, além do trabalho com artesanato, que inclui peças criadas a partir do couro de gado bovino. Isso porque a pecuária sustentável é, ao lado da implementação dos PGTAs, uma das quatro linhas gerais do Bem Viver. 

“Temos 36 Terras Indígenas, em um total de 10 milhões de hectares de floresta. O trabalho desenvolvido por meio dos Planos de Gestão Territorial e Ambiental é uma maneira de a gente poder ocupar e mostrar ao estado brasileiro que temos produção, tanto de agricultura como de pecuária, e mostrar para o mundo que a gente não precisa envenenar nossa terra para produzir alimento”, afirma Edinho Batista, do povo Macuxi (comunidade Maturuca) e coordenador-geral do CIR.

Para ele, parcerias com o IEB e a USAID são um marco que garantem o fortalecimento da sustentabilidade das comunidades indígenas em diversas áreas. “Isso é um dos marcos que somam muito ao fortalecer essa economia e, ao mesmo tempo, a autonomia das comunidades, com uma determinação forte na questão jurídica, política e econômica”, completa Batista. 

Em Roraima, 11% dos moradores se declaram indígenas, de acordo com dados do Censo de 2010, o último disponível pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE – a atualização deve ser divulgada neste ano). Com isso, é o estado brasileiro com o maior percentual de indígenas em relação ao total de sua população.

Formação constante - O projeto Bem Viver trabalha em outras duas linhas – a de formação de agentes para atuarem tanto na conservação ambiental como na proteção dos territórios e o fortalecimento institucional do CIR, uma das maiores e mais consolidadas organizações indígenas do Brasil.

Em janeiro, o CIR reuniu cerca de 2.000 pessoas entre lideranças, indígenas de outras etnias e representantes de parceiros para marcar as comemorações dos 50 anos da primeira assembleia que criou o conselho (leia mais aqui).

Atualmente o CIR conta com cinco brigadas comunitárias, com 65 brigadistas aptos a trabalhar, que atuam nas regiões da Serra da Lua, Surumu, Tabaio, Wai-Wai e Murupu. Além disso, formou mais de 300 indígenas como Agentes Territoriais e Ambientais (ATAIs), que trabalham em várias comunidades, e os integrantes do Grupo de Proteção e Vigilância Territorial Indígena (GPVIT). Foram capacitados indígenas para articulação de projetos e jovens comunicadores. Há mulheres indígenas atuando em todos esses grupos.

“As mulheres têm um papel fundamental. Elas têm de dizer o que podem e o que querem fazer. Atuamos para ajudar nesse processo”, diz Maria Betânia Mota de Jesus, do povo Macuxi, secretária-geral do CIR.

Para a diretora do Programa de Meio Ambiente da USAID/Brasil, Catherine Hamlin, uma das formas mais eficazes de avançar nas oportunidades e com o desenvolvimento econômico das comunidades indígenas é trabalhando por meio de suas lideranças e em instituições representativas. “Vemos que trabalhando com o CIR e suas comunidades regionais podemos apoiar tanto a implementação da gestão ambiental e territorial no estado como outras atividades, incluindo as produtivas sustentáveis.” 

Cloude Correia, da coordenação do Programa de Povos Indígenas do IEB, destaca a importância da participação dos próprios indígenas no projeto. “As comunidades participam de todo o processo e ajudam a fazer o planejamento. Essa participação na gestão é fundamental.”

Conheça mais sobre o Bem Viver.