Indígenas atuam para recuperação de espécies nativas da Amazônia
Setembro, 2022 - “Acreditamos que cada espécie de árvore tem um espírito, por isso temos respeito por elas. Nossa força vem dos espíritos. A Mãe Natureza nos alimenta, nos dá vida. Precisamos retribuir o que ela nos oferece cuidando da floresta. Restaurar é trazer as espécies de volta, fortalecendo assim nossa vida espiritual”, diz a liderança indígena Alcimara Karipuna, vice-coordenadora-geral da Associação Indígena do Povo Karipuna - AIKA.
A associação foi uma das oito entidades selecionadas pelo edital USAID-USFS-Funai 001/2021 para implementar projetos de recuperação de áreas degradadas e recomposição de vegetação nativa em Terras Indígenas (TIs). O projeto faz parte do Programa de Manejo Florestal e Prevenção de Fogo no Brasil, executado pelo Serviço Florestal dos Estados Unidos (USFS), com apoio da USAID/Brasil, dentro da Parceria para a Conservação da Biodiversidade na Amazônia (PCAB), em colaboração com a Fundação Nacional do Índio (FUNAI).
Para o povo indígena Karipuna, restaurar áreas da floresta amazônica tem um significado especial – representa a vida, plantando espécies arbóreas que fornecem produtos necessários ao dia a dia das comunidades, como madeira para os barcos, frutos usados na pintura corporal, além de folhas e plantas medicinais. “Essas espécies fazem parte da nossa vida. Não conseguimos pescar, se não tivermos madeira para fazer canoas. Não podemos usar as canoas, se não houver remos. Não temos pintura corporal, se não tiver jenipapo”, resume Alcimara.
A AIKA representa o povo indígena Karipuna no município de Oiapoque, no Estado do Amapá. Por meio do projeto, brigadistas e agentes ambientais indígenas (conhecidos como “AGAMINs”) vão mapear espécies de árvores e plantas que estão diminuindo na região da TI Uaçá, uma área de 470 mil hectares de floresta, onde vivem cerca de 4.400 indígenas.
“Estamos sentindo falta de algumas espécies de plantas da medicina tradicional e do jenipapo que usamos na pintura. Queremos trazê-las de volta”, afirma Alcimara.
Com o crescimento populacional de Oiapoque, a pressão sobre a TI Uaçá aumentou, principalmente com a extração de recursos naturais, como madeira, frutos, caça e pesca, diminuindo a quantidade de espécies importantes para a alimentação das populações indígenas. Além disso, o impacto das mudanças climáticas vem sendo sentido na região, principalmente na produção de alimentos.
“Entre o final de 2021 e o início deste ano, perdemos muitas roças de mandioca, que usamos para fazer farinha, por causa de uma doença na planta que não conhecemos. Ela fica como se jogasse água quente na roça. Isso mudou nossa maneira de nos alimentar. Por isso, aliar o conhecimento milenar indígena ao científico pode nos ajudar a entender o que está acontecendo”, explica Alcimara.
Uma das atividades do projeto, segundo a coordenadora, é fazer o mapeamento das espécies que cada comunidade pretende recuperar e montar um viveiro para depois distribuir as mudas. “As sementes e mudas são como crianças. Precisamos cuidar sempre, com atenção. Esse trabalho será feito pelos brigadistas indígenas e agentes ambientais.”
O projeto - Além da AIKA, foram selecionadas outras sete iniciativas elaboradas por brigadistas indígenas, com o apoio de associações indígenas e organizações parceiras, para promover a recuperação de áreas degradadas em TIs na Amazônia Legal e Pantanal. São elas: TI Araribóia, TI Caru, TI Governador, TI Kadiwéu, TI Krikati, TI Porquinhos e TI Xerente/Funil.
A ideia é fortalecer as associações com equipamentos, meios de transporte, insumos para viveiros, entre outros itens, para que brigadistas desenvolvam atividades como a produção e o plantio de mudas para a recuperação de áreas de nascentes, matas ciliares e sistemas agroflorestais, além da queima prescrita, uma técnica aplicada para a prevenção de fogo na época dos incêndios mais severos, que diminui os riscos de incêndios florestais.
As atividades também vão desenvolver a conscientização e educação ambiental para o manejo integrado do fogo e promover trocas de experiências sobre viveiros de mudas e uso tradicional do fogo. Participam da iniciativa, além dos brigadistas indígenas, jovens, mulheres, anciãos e líderes locais.